quinta-feira, 21 de março de 2013

Aval, novação e recuperação judicial

Aval, novação e recuperação judicial

Autor(es): Bruno Valladão Guimarães Ferreira
Valor Econômico - 21/03/2013
 

 

O tema desse artigo é a possibilidade de se cobrar, ou não, do avalista de devedor que impetra recuperação judicial.

Desde o julgamento dos embargos de divergência em agravo nº 1.179.654-SP, em março de 2012, pela 2ª Seção do Superior Tribunal de Justiça (STJ), a 3ª e a 4ª Turma da Corte parecem haver firmado jurisprudência no sentido de que o avalista responderá sempre, exceto na hipótese de ser também sócio da devedora principal e com responsabilidade ilimitada, quando estaria blindado apenas nos primeiros 180 dias - período em que são suspensas as execuções contra a avalizada.

A Corte possui, em síntese, dois argumentos. Um, de que o aval (modalidade de garantia de uma obrigação, assumida num título de crédito) é autônomo, ou seja, existe independentemente do negócio que deu origem ao título e das relações dele constantes. Outro, de que a Lei de Recuperação de Empresas, em seus arts. 49, parágrafo 1º e 2º; e 59, caput, determina que os credores "conservam seus direitos contra os coobrigados", sendo o plano aprovado "sem prejuízo das garantias", "salvo se de modo diverso ficar estabelecido no plano".

Com o devido respeito, porém, divergimos desse entendimento.

A leitura isolada desses dispositivos dá a entender que, na recuperação judicial, em regra, preserva-se o aval, que somente é extinto se o plano assim determinar.

No entanto, a Lei de Falências deve ser interpretada em conformidade a todo ordenamento jurídico, principalmente quando trata de institutos estranhos à especialidade de sua matéria.

E, no que tange ao aval e à novação, o Código Civil é, sem dúvidas, mais específico do que a lei falimentar.

A novação é definida pelo Código Civil como sendo a constituição de uma obrigação nova em substituição à anterior, que fica extinta.

De acordo com seu art. 364, a novação "extingue as garantias da dívida sempre que não houver estipulação em contrário" pelas partes que figuram na nova relação e pelo garantidor.

Portanto, pelo Código Civil, em regra, no silêncio das partes e do avalista, a novação acarretará a extinção do aval. E isso não depende da característica da autonomia dessa garantia, pois o desaparecimento de todas as relações anteriores havidas dentro de um título de crédito entre credor, devedor principal e avalista é necessário para que estes não permaneçam duplamente vinculados perante aquele.

Desse modo, ao interpretar a Lei de Falências em conformidade ao Código Civil, entendemos que, com a aprovação do plano pelos credores, seguida da decisão judicial que a homologa e concede a recuperação judicial ao devedor, as dívidas são novadas (novação "sui generis", pois condicionada ao cumprimento do plano durante a recuperação) e o aval somente persistirá caso conste expressamente do plano, devendo ser criado novo título de crédito, cuja obrigação principal corresponderá àquela assumida no plano, e no qual o avalista formalizará a prestação da garantia.

Aliás, permitir-se que a extinção do aval em razão da novação seja regra em todas as relações exceto na recuperação judicial é colaborar para a indesejada insegurança jurídica em nosso ordenamento. O plano deve ser apresentado pelo devedor em até 60 dias contados da decisão judicial que defere o processamento de sua recuperação e que, no mesmo ato, suspende por 180 dias as execuções contra o mesmo.

A suspensão objetiva oferece tempo para reorganizar suas atividades e renegociar suas dívidas, sem que no período possa vir a quebrar por bloqueios ou expropriações de seus bens. O êxito da negociação gerará, justamente, o plano de recuperação.

Os 180 dias coincidem com outros prazos legais ao fim dos quais o plano deverá estar votado pelos credores. E, então, ou não terá sido aprovado e a falência será decretada ou o terá sido, e a recuperação será concedida com a consequente novação das dívidas.

Portanto, dentro daqueles 180 dias, o avalista pode vir a ser cobrado porque ainda não há novação.

Notamos, aqui, que a Lei de Falências também suspende as execuções promovidas por "credores particulares do sócio solidário". Para os aludidos tribunais, se o avalista é sócio solidário às obrigações da sociedade (sua responsabilidade é ilimitada), a ele incide tal suspensão.

Todavia, em nosso entender, suspensas são as execuções movidas por "credores particulares", exclusivos de alguém que seja sócio ilimitadamente responsável de empresa que impetrou recuperação; e não aquelas propostas por credores da sociedade contra avalista que também é sócio, já que é apenas sua qualidade de avalista - e não de sócio solidário - que se considera para se definir se responderá, ou não, pela dívida. O sócio-avalista deve estar ciente dos riscos da garantia, que não é mera formalidade.

Por fim, consignamos que o plano pode estabelecer obrigações para além do período dentro do qual o devedor estiver sob recuperação judicial (em tese, no máximo 2 anos, conforme arts. 61 e 63). No entanto, caso descumpra obrigação posterior, a consequência será a falência sem o retorno às condições anteriores à aprovação do plano - mantendo-se, porém, o eventual título criado em razão da preservação do aval (art. 62).

Concluímos no sentido de que o avalista, sócio ou não, responde enquanto não proferida a decisão que concede a recuperação judicial da sociedade; caso o plano não seja aprovado pelos credores; se, durante o processo de recuperação judicial, alguma obrigação do plano for descumprida, cuja consequência será a decretação da quebra com os credores tendo "reconstituídos seus direitos e garantias nas condições originalmente contratadas" (art. 61, § 1º e 2º, da Lei de Falências, dessa vez em consonância ao Código Civil). Ou ainda se, após o encerramento da recuperação, o devedor descumprir obrigação do plano, o que dará ensejo à execução do título de crédito constituído quando da aprovação do plano que houver preservado o aval.

Bruno Valladão Guimarães Ferreira é advogado

Este artigo reflete as opiniões do autor, e não do jornal Valor Econômico. O jornal não se responsabiliza e nem pode ser responsabilizado pelas informações acima ou por prejuízos de qualquer natureza em decorrência do uso dessas informações

 

protesto e súmulas do STJ

Súmula 475:

"Responde pelos danos decorrentes de protesto indevido o endossatário que recebe por endosso translativo título de crédito contendo vício formal extrínseco ou intrínseco, ficando ressalvado seu direito de regresso contra os endossantes e avalistas."

Súmula 476: "O endossatário de título de crédito por endosso-mandato só responde por danos decorrentes de protesto indevido se extrapolar os poderes de mandatário".

terça-feira, 12 de março de 2013

PROMISSÓRIA COM ASSINATURA ESCANEADA NÃO PODE ARGUIR NULIDADE

DEVEDOR QE EMITIU PROMISSÓRIA COM ASSINATURA ESCANEADA NÃO PODE ARGUIR NULIDADE FORMA POR SEU PRÓPRIO ATO.
 
A teoria dos atos próprios e a boa-fé autorizam, no caso concreto, a validação da promissória que não observou regras formais. Assim, ainda que a norma cambiária internacional exija que a assinatura da nota seja de próprio punho, o devedor que reconhece ter assnado o título por meio de imagem escaneada nao pode alega sua nulidade. A decisão é da Terceira Turma do Superor Tribunal de Justiça (STJ).
 
O ministro Paulo de Tarso Sanseverino rejeitou os argumentos das instâncias ordinárias, que afirmavam haver respaldo legal expresso para as assinaturas escaneadas. Porém manteve a decisão final, com fundamento nos princípios gerais de direito.
 
PRINCÍPIOS E FORMAS
 
De acordo com o relator, as norms cambiárias internacional e nacional estabelecem a assinatura de próprio punho como requisito de existência e validade da nota promissória. Para o ministro, é evidente que ''a assinatura escaneada, aposta no título, não poderia produzir efeitos cambiais.''
''A fundamentação até aqui delineadam restrita às formalidades típicas do direito cambiário, conduziria ao provimento do recuro especial para declarar a invalidade de obrigação cambial por falta do requisito da assinatura do emitente'', avaliou.
''Porém, faz-se necessário ulrapassar as balizas formais do direito cambiário e passar a analisar a controvérsia na perspectiva dos princípios gerais que orientam todo o sistema jurídico de direito privado, em particular o princípio da boa-fé objetiva'', poderou Sanseverino.
 
ATO PRÓPRIO
 
O minisro destacou que em nenhum momento se cogitou de fraude ou falsificação da assinatura. Ao contrário, o proprio devedor confessa ter lançado a assinatura viciada na nota promissória. Dessa forma, seria o caso de impedir que o violador da norma use a própria norma que violou para exercer um direito. Também não poderia alegar direito contrário ao comportamento jurídico assumido antes.
 
''Com efeito, a norma inobservada pelo emitente é a do artigo 75 da Lei Uniforme de Genebra, que estabelece a assinatura do emitente como requisito de validade da ota promissória, devendo a assinatura ser de próprio punho, ante a inexistencia de previsão legal ou de outra modalidade de assinatura na época de emissão da cártula'', esclareceu o relator.
 
''Essa mesma norma'', concluiu o ministro, ''é invocada pelo emitente na ação declaratória de nulidade do título de crédito, configurando clara hipótese de aplicação das situações jurídicas sintetizadas nos brocardos venire contra factum proprium'' – ou seja, não se pode invocar uma norma jurídica depois de descumprila, e não se pode agir de modo contraditório na execução do contrato.
 
Recurso Especial número 1192678
Fonte: STJ

Execução de cheque exige sua apresentação no prazo legal

11/03/2013 - 09h14
DECISÃO
Execução de cheque exige sua apresentação no prazo legal
Para poder ser executado, o cheque deve ter sido apresentado à instituição financeira. O entendimento é da Quarta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ). Para o ministro Luis Felipe Salomão, a falta de comprovação do não pagamento do título retira sua exigibilidade. 

No caso analisado, porém, a Turma permitiu a execução, já que as instâncias ordinárias afirmaram, com base em provas que não poderiam ser reapreciadas no STJ, que o devedor sustou o cheque, o que tornaria inútil sua apresentação prévia ao banco sacado. 

Apresentação 

Segundo o relator, "por materializar uma ordem a terceiro para pagamento à vista", o cheque tem seu momento natural de realização na apresentação, "quando então a instituição financeira verifica a existência de disponibilidade de fundos, razão pela qual a apresentação é necessária, quer diretamente ao sacado quer por intermédio do serviço de compensação". 

"A apresentação do cheque ao banco sacado é medida que se impõe ao seu pagamento pela instituição sacada ou mediante compensação, obedecendo ao prazo de 30 ou de 60 dias a depender do local de emissão, sendo certo que tal prazo tem a função precípua de assegurar o direito de execução contra os codevedores do título", completou. 

Exigibilidade

"O beneficiário de cheque que não apresenta o título para adimplemento, via de regra, vê-se impossibilitado de promover a execução, haja vista que tal título não ostenta o requisito essencial da exigibilidade, que somente se dá com a comprovação da falta de pagamento, a qual pode ocorrer pelo protesto, por declaração do banco sacado ou da câmara de compensação", concluiu o ministro Salomão. 

A Turma, no entanto, manteve a conclusão das instâncias ordinárias, aceitando a execução, mas por fundamento diverso. Segundo o relator, a sustação do cheque emitido tornou inútil a apresentação do título ao banco antes da execução.