quarta-feira, 28 de setembro de 2011

Tratado Internacional e Lei Posterior

 
 
 
Brasília, 29 de agosto a 2 de setembro de 2011 - Nº 638.

PLENÁRIO


Contribuintes residentes ou domiciliados no estrangeiro: tratado internacional e lei posterior - 1

O Plenário iniciou julgamento de recursos extraordinários em que discutida a obrigatoriedade, ou não, da retenção na fonte e do recolhimento de imposto de renda, no ano-base de 1993, quanto a dividendos enviados por pessoa jurídica brasileira a sócio residente na Suécia. Na espécie, não obstante a existência de convenção internacional firmada entre o Brasil e aquele Estado, a qual assegura tratamento não discriminatório entre ambos os países, adviera legislação infraconstitucional que permitira essa tributação (Lei 8.383/91, art. 77 e Regulamento do Imposto de Renda de 1994 - RIR/94), isentando apenas os lucros recebidos por sócios residentes ou domiciliados no Brasil (Lei 8.383/91, art. 75). A pessoa jurídica pleiteara, na origem, a concessão de tratamento isonômico entre os residentes ou domiciliados nos mencionados Estados, com a concessão da benesse. Alegara, ainda, que, nos termos do art. 98 do CTN, o legislador interno não poderia revogar isonomia prevista em acordo internacional. Ocorre que o pleito fora julgado improcedente, sentença esta mantida em sede recursal, o que ensejara a interposição de recursos especial e extraordinário. Com o provimento do recurso pelo STJ, a União também interpusera recurso extraordinário, em que defende a mantença da tributação aos contribuintes residentes ou domiciliados fora do Brasil. Sustenta, para tanto, ofensa ao art. 97 da CF, pois aquela Corte, ao afastar a aplicação dos preceitos legais referidos, teria declarado, por órgão fracionário, sua inconstitucionalidade. Argumenta que a incidência do art. 98 do CTN, na situação em apreço, ao conferir superioridade hierárquica aos tratados internacionais em relação à lei ordinária, transgredira os artigos 2º; 5º, II e § 2º; 49, I; 84, VIII, todos da CF. Por fim, aduz inexistir violação ao princípio da isonomia, dado que tanto o nacional sueco quanto o brasileiro têm direito a isenção disposta no art. 75 da Lei 8.383/91, desde que residentes ou domiciliados no Brasil.
RE 460320/PR, rel. Min. Gilmar Mendes, 31.8.2011. (RE-460320) Audio

Contribuintes residentes ou domiciliados no estrangeiro: tratado internacional e lei posterior – 2
O Min. Gilmar Mendes, relator, proveu o recurso extraordinário da União e afastou a concessão da isenção de imposto de renda retido na fonte para os não-residentes. Julgou, ademais, improcedente o pedido formulado na ação declaratória, assentando o prejuízo do apelo extremo da sociedade empresária. Ante a prejudicialidade da matéria, apreciou, inicialmente, o recurso interposto pela União, admitindo-o. Assinalou o cabimento de recurso extraordinário contra decisão proferida pelo STJ apenas nas hipóteses de questões novas, lá originariamente surgidas. Além disso, apontou que, em se tratando de recurso da parte vencedora (no segundo grau de jurisdição), a recorribilidade extraordinária, a partir do pronunciamento do STJ, seria ampla, observados os requisitos gerais pertinentes. No tocante ao art. 97 da CF, consignou que o acórdão recorrido não afastara a aplicação do art. 77 da Lei 8.383/91 em face de disposições constitucionais, mas sim de outras normas infraconstitucionais, sobretudo o art. 24 da Convenção entre o Brasil e a Suécia para Evitar a Dupla Tributação em Matéria de Impostos sobre a Renda e o art. 98 do CTN. Isso porque essa inaplicabilidade não equivaleria à declaração de inconstitucionalidade, nem demandaria reserva de plenário. Quanto à suposta afronta aos artigos 2º; 5º, II e § 2º; 49, I; 84, VIII, todos da CF, após digressão evolutiva da jurisprudência do STF relativamente à aplicação de acordos internacionais em cotejo com a legislação interna infraconstitucional, asseverou que, recentemente, esta Corte afirmara que as convenções internacionais de direitos humanos têm status supralegal e que prevalecem sobre a legislação interna, submetendo-se somente à Constituição. Salientou que, no âmbito tributário, a cooperação internacional viabilizaria a expansão das operações transnacionais que impulsionam o desenvolvimento econômico, o combate à dupla tributação internacional e à evasão fiscal internacional, e contribuiria para o estreitamento das relações culturais, sociais e políticas entre as nações.
RE 460320/PR, rel. Min. Gilmar Mendes, 31.8.2011. (RE-460320)

Contribuintes residentes ou domiciliados no estrangeiro: tratado internacional e lei posterior - 3

O relator frisou, no entanto, que, pelas peculiaridades, os tratados internacionais em matéria tributária tocariam em pontos sensíveis da soberania dos Estados. Demandariam extenso e cuidadoso processo de negociação, com a participação de diplomatas e de funcionários das respectivas administrações tributárias, de modo a conciliar interesses e a permitir que esse instrumento atinja os objetivos de cada nação, com o menor custo possível para a receita tributária de cada qual. Pontuou que essa complexa cooperação internacional seria garantida essencialmente pelo pacta sunt servanda. Nesse contexto, registrou que, tanto quanto possível, o Estado Constitucional Cooperativo reinvindicaria a manutenção da boa-fé e da segurança dos compromissos internacionais, ainda que diante da legislação infraconstitucional, notadamente no que se refere ao direito tributário, que envolve garantias fundamentais dos contribuintes e cujo descumprimento colocaria em risco os benefícios de cooperação cuidadosamente articulada no cenário internacional. Reputou que a tese da legalidade ordinária, na medida em que permite às entidades federativas internas do Estado brasileiro o descumprimento unilateral de acordo internacional, conflitaria com princípios internacionais fixados pela Convenção de Viena sobre Direito dos Tratados (art. 27). Dessa forma, reiterou que a possibilidade de afastamento da incidência de normas internacionais tributárias por meio de legislação ordinária (treaty override), inclusive em sede estadual e municipal, estaria defasada com relação às exigências de cooperação, boa-fé e estabilidade do atual panorama internacional. Concluiu, então, que o entendimento de predomínio dos tratados internacionais não vulneraria os dispositivos tidos por violados. Enfatizou que a República Federativa do Brasil, como sujeito de direito público externo, não poderia assumir obrigações nem criar normas jurídicas internacionais à revelia da Constituição. Observou, ainda, que a recepção do art. 98 do CTN pela ordem constitucional independeria da desatualizada classificação em tratados-contratos e tratados-leis.
RE 460320/PR, rel. Min. Gilmar Mendes, 31.8.2011. (RE-460320)

Contribuintes residentes ou domiciliados no estrangeiro: tratado internacional e lei posterior - 4

Ressaltou, também, inexistir justificativa para a restrição da cooperação internacional pelo Brasil por motivos de regramentos típicos de âmbito interno. No que concerne ao art. 150, II, da CF, distinguiu a vedação à discriminação da isonomia tributária. Mencionou que, por intermédio daquela, prevista no tratado internacional em apreço, os Estados pactuantes acordaram não conferir tratamento desvantajoso aos súditos do outro Estado-parte, sem impedir, no entanto, eventual tratamento mais benéfico. Considerou, por outro lado, que o acórdão recorrido tornara equivalentes situações incomparáveis, ao misturar critérios distintos como a residência e a nacionalidade. Aduziu que o elemento de conexão predominante na convenção Brasil-Suécia (art. 24) — e geralmente tutelado na vedação à discriminação em todos os tratados contra a bitributação da renda — seria a nacionalidade. Por sua vez, a Lei 8.383/91 utilizou a residência como critério, ao estipular a alíquota de 15% no imposto de renda na fonte incidente sobre lucros e dividendos de residentes ou domiciliados no exterior. Assim, enquanto os residentes no Brasil foram isentos dessa exação por lucros e dividendos apurados em 1993 (Lei 8.383/91, art. 75), os residentes no exterior foram tributados, independentemente da nacionalidade do contribuinte. Logo, a legislação brasileira assegurara ao súdito sueco a isenção, desde que residente no Brasil. Considerou que o acórdão adversado, em ofensa ao art. 150, II, da CF, confundira o critério de conexão nacionalidade com o de residência, uma vez que estendera a todos os súditos suecos residentes no exterior benesses fiscais concedidas só aos residentes no Brasil. Aludiu que, atualmente, tanto os residentes como os não residentes estariam isentos do imposto de renda retido na fonte de rendimentos provenientes de dividendos ou lucros distribuídos por pessoas jurídicas tributadas no Brasil (Lei 9.249/95, art. 10). O relator arrematou, em suma, que: a) a cláusula de reserva de plenário, contida no art. 97 da CF, não teria sido violada; b) o art. 98 do CTN seria compatível com a nova ordem constitucional e sua subsunção, no caso, não transgrediria os artigos 2º; 5º, II e § 2º; 49, I; 84, VIII, todos da CF; e c) a extensão concedida pelo STJ ofenderia o art. 150, II, da CF, por ampliar, aos súditos suecos, tratamento não concedido aos nacionais brasileiros. Após, pediu vista o Min. Dias Toffoli.
RE 460320/PR, rel. Min. Gilmar Mendes, 31.8.2011. (RE-460320)

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"Cumpre assinalar, finalmente, que os atos internacionais, uma vez regularmente incorporados ao direito interno, situam-se no mesmo plano de validade e eficácia das normas infraconstitucionais. Essa visão do tema foi prestigiada em decisão proferida pelo Supremo Tribunal Federal no julgamento do RE nº 80.004-SE (RTJ 83/809, Rel. p/ o acórdão Min. CUNHA PEIXOTO), quando se consagrou, entre nós, a tese - até hoje prevalecente na jurisprudência da Corte (e recentemente reiterada no julgamento da ADI nº 1.480-DF, Rel. Min. CELSO DE MELLO) - de que existe, entre tratados internacionais e leis internas brasileiras, de caráter ordinário, mera relação de paridade normativa.

A normatividade emergente dos tratados internacionais, dentro do sistema jurídico brasileiro, por isso mesmo, permite situar esses atos de direito internacional público, no que concerne à hierarquia das fontes, no mesmo plano e no mesmo grau de eficácia em que se posicionam as leis internas (JOSÉ ALFREDO BORGES, in Revista de Direito Tributário, vol. 27/28, p. 170-173; FRANCISCO CAMPOS, in RDA 47/452; ANTONIO ROBERTO SAMPAIO DORIA, "Da Lei Tributária no Tempo", p. 41, 1968; GERALDO ATALIBA, "Apontamentos de Ciência das Finanças, Direito Financeiro e Tributário", p. 110, 1969, RT; IRINEU STRENGER, "Curso de Direito Internacional Privado", p. 108/112, 1978, Forense; JOSÉ FRANCISCO REZEK, "Direito dos Tratados", p. 470/475, itens 393-395, 1984, Forense, v.g.).

A eventual precedência dos atos internacionais sobre as normas infraconstitucionais de direito interno somente ocorrerá - presente o contexto de eventual situação de antinomia com o ordenamento doméstico -, não em virtude de uma inexistente primazia hierárquica, mas, sempre, em face da aplicação do critério cronológico (lex posterior derogat priori) ou, quando cabível, do critério da especialidade (RTJ 70/333 - RTJ 100/1030 - RT 554/434).

De qualquer maneira, impõe-se aguardar, no caso ora em análise, a definitiva incorporação, ao sistema de direito positivo interno brasileiro, do Protocolo de Medidas Cautelares aprovado no âmbito do MERCOSUL, sem o que esse ato de direito internacional público não poderá ser aplicado, no âmbito doméstico, pelas autoridades nacionais.

Assim sendo, e tendo em consideração as razões expostas, nego exequatur à presente carta rogatória.
Devolva-se, por via diplomática, a presente comissão rogatória, à Justiça rogante.
Publique-se.
Brasília, 04 de maio de 1998."

terça-feira, 27 de setembro de 2011

Credor deve demonstrar origem da dívida em ação de cobrança com base em cheque prescrito

27/09/2011 - 08h45
DECISÃO
Credor deve demonstrar origem da dívida em ação de cobrança com base em cheque prescrito
O credor deve demonstrar em juízo o negócio jurídico que deu origem à emissão do cheque para fazer valer o pedido condenatório fundado em ação de cobrança, depois de expirado o prazo de dois anos para o ajuizamento da ação de enriquecimento ilícito, previsto na Lei 7.347/84, conhecida como Lei do Cheque. A decisão é da Quarta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) em recurso no qual o credor reivindicava a desnecessidade de menção à origem da dívida.

A Quarta Turma discutiu essa exigência depois de expirado o prazo previsto no artigo 61 da Lei do Cheque, hipótese em que o credor, conforme previsão do art. 62 da mesma lei, tem a faculdade de ajuizar ação de cobrança com base na relação causal.

No caso julgado pelo STJ, os cheques foram emitidos em 6 de dezembro de 1998 e a ação de enriquecimento ilícito, também chamada de ação de locupletamento ilícito, foi proposta em 3 de agosto de 2001, fora do prazo de dois anos previsto na Lei do Cheque para a interposição desse tipo de ação. O credor sustentou no STJ que os cheques perdiam a força executiva, mas mantinha a natureza de título de crédito.

De acordo com a Lei do Cheque, o credor tem o prazo de trinta ou sessenta dias para apresentá-lo à agência bancária, conforme seja da mesma praça ou de praça diversa. Após o prazo previsto para apresentação, tem ainda seis meses para executá-lo, período em que o cheque goza do atributo de título executivo.

Depois desse prazo, o credor tem até dois anos para ajuizar a ação de locupletamento ilícito com base na titularidade do cheque, não sendo necessária menção à relação causal subjacente. Passado esse prazo, o título perde seus atributos cambiários, devendo o credor ajuizar ação de cobrança com base na relação que deu origem ao cheque.

Segundo o relator, ministro Luis Felipe Salomão, tendo a ação de cobrança sido ajuizada mais de dois anos após a prescrição dos cheques, já não é cabível a utilização da ação prevista no artigo 61 da Lei do Cheque, sendo imprescindível a menção ao negócio jurídico subjacente, conforme previsto no art. 62 da mesma lei.

A cártula, segundo o relator, serve como início de prova daquele negócio que deve ser mencionado. Salomão explicou que o prazo de prescrição desse tipo de ação de cobrança é o inerente ao negócio jurídico firmado pelas partes.
 
 
RECURSO ESPECIAL Nº 1.190.037 - SP (2010⁄0067085-0)
 
RELATOR : MINISTRO LUIS FELIPE SALOMÃO
RECORRENTE : BALUMA S⁄A
ADVOGADO : JULIANA LÚCIA FINELLI E OUTRO(S)
RECORRIDO : ADALBERTO ALVES SANTANA
ADVOGADO : ADRIANA NADUR MOTTA CLEMENTE

 

EMENTA

 

DIREITO COMERCIAL. RECURSO ESPECIAL. CHEQUES. BENEFICIÁRIA DOMICILIADA NO EXTERIOR. PRAÇA DE EMISSÃO. OBSERVÂNCIA AO QUE CONSTA NA CÁRTULA. AÇÃO DE LOCUPLETAMENTO SEM CAUSA DE NATUREZA CAMBIAL.  TRANSCURSO DO PRAZO PREVISTO NO ARTIGO 61 DA LEI 7.357⁄85. POSSIBILIDADE DE AJUIZAMENTO DE AÇÃO DE COBRANÇA, COM DESCRIÇÃO DO NEGÓCIO JURÍDICO SUBJACENTE, OU DE AÇÃO MONITÓRIA, CUJO PRAZO PRESCRICIONAL É DE 5 ANOS.

1. O cheque é título de crédito que se submete aos princípios cambiários da cartularidade, literalidade, abstração, autonomia das obrigações cambiais e inoponibilidade das exceções pessoais a terceiros de boa-fé, por isso deve ser considerado como local de emissão o indicado no título.

2.  O artigo 33 da Lei 7.357⁄85 prevê expressamente que o cheque pode ser emitido no exterior, não podendo, portanto, servir de escusa a alegação de que o local consignado na cártula diverge daquele em que ela foi efetivamente emitida por a beneficiária não ter domicílio no Brasil.

3. O fato de a tomadora ter domicílio no estrangeiro não elide, por si só, a possibilidade de o cheque ter sido recebido na praça constante da cártula, ainda que por um representante ou preposto da tomadora.

4. O cheque é ordem de pagamento à vista, sendo de 6 (seis) meses o lapso prescricional para a execução após o prazo de apresentação, que é de 30 (trinta) dias a contar da emissão, se da mesma praça, ou de 60 (sessenta) dias, também a contar da emissão, se consta no título como sacado em praça diversa, isto é, em município distinto daquele em que se situa a agência pagadora.

5. Prescrito o prazo para execução do cheque, o artigo 61 da Lei do Cheque prevê, no prazo de 2 (dois) anos a contar da prescrição, a possibilidade de ajuizamento de ação de locupletamento ilícito que, por ostentar natureza cambial, prescinde da descrição do negócio jurídico subjacente. Expirado o prazo para ajuizamento da ação por enriquecimento sem causa, o artigo 62 do mesmo Diploma legal ressalva ainda a possibilidade de ajuizamento de ação fundada na relação causal, a exigir, portanto, menção ao negócio jurídico que ensejou a emissão do cheque.

6. A jurisprudência desta Corte admite também o ajuizamento de ação monitória (Súmula 299⁄STJ) com base em cheque prescrito, sem necessidade de descrição da causa debendi, reconhecendo que a cártula satisfaz a exigência da "prova escrita sem eficácia de título executivo", a que alude o artigo 1.102-A do CPC.

7. Recurso especial não provido.

 

ACÓRDÃO

 

A Turma, por unanimidade, negou provimento ao recurso especial, nos termos do voto do Sr. Ministro Relator.Os Srs. Ministros Raul Araújo, Maria Isabel Gallotti, Antonio Carlos Ferreira e Marco Buzzi votaram com o Sr. Ministro Relator.

 

Brasília (DF), 06 de setembro de 2011(Data do Julgamento)

 

 

MINISTRO LUIS FELIPE SALOMÃO

Relator

 
 
 
RECURSO ESPECIAL Nº 1.190.037 - SP (2010⁄0067085-0)
 
RECORRENTE : BALUMA S⁄A
ADVOGADO : JULIANA LÚCIA FINELLI E OUTRO(S)
RECORRIDO : ADALBERTO ALVES SANTANA
ADVOGADO : ADRIANA NADUR MOTTA CLEMENTE

 

RELATÓRIO

 

O SENHOR MINISTRO LUIS FELIPE SALOMÃO (Relator):

 

1. Baluma S⁄A ajuizou ação de cobrança em face de Adalberto Alves Santana, sustentando que o réu emitiu, em seu favor, cheques, perfazendo o valor total de R$ 126.000,00 (cento e vinte e seis mil reais). Argumenta que deixou de depositar as cártulas, diante da afirmação do requerido, a respeito da inexistência de fundos em sua conta. Sustenta que os cheques perderam a força executiva, mas não a natureza de títulos de crédito, por isso desnecessária a menção a causa subjacente.

O Juízo de Direito da 5ª Vara Cível da Comarca de São Paulo julgou parcialmente procedentes os pedidos formulados na inicial, por entender que os cheques foram emitidos na mesma praça, tendo a ação sido ajuizada dentro do prazo previsto no artigo 61 da Lei 7.347⁄85, apenas no que tange a um dos cheques.

Interpôs o réu apelação e o autor recurso adesivo para o Tribunal de Justiça de São Paulo, que negou provimento aos recursos, "com observação".

O acórdão tem a seguinte ementa:

Ação de cobrança fundada em cheques prescritos. Lapso prescricional trienal contado da entrada em vigor do NCC. Ação proposta em relação a parte dos títulos quando já decorrido o período de dois anos após o prazo prescricional da execução. Necessidade de menção à causa subjacente em relação a esses títulos, não bastando a apresentação dos documentos. Inteligência do art. 62 da Lei 7.357⁄85.
Carência reconhecida. Recursos não providos.
 

Opostos embargos de declaração, foram rejeitados.

Inconformada com a decisão, interpôs a autora recurso especial com fundamento no artigo 105, incisos III, alíneas "a" e "c", da Constituição Federal sustentando divergência jurisprudencial e violação aos artigos 33, 59 e 61 da Lei 7.357⁄85.

Sustenta que os cheques continuam sendo títulos de crédito, pois foram emitidos em praça diversa, pois é empresa estrangeira.

Alega que, ainda que nos respectivos cheques conste a praça de São Paulo como a da emissão, não haveria como as cártulas terem sido emitidas naquela Município, tendo em vista que a beneficiária tem sede no exterior.

Não foram oferecidas contrarrazões.

Dei provimento ao agravo de instrumento para determinar a subida do recurso especial. (Fl. 724)

É o relatório.

 
RECURSO ESPECIAL Nº 1.190.037 - SP (2010⁄0067085-0)
 
RELATOR : MINISTRO LUIS FELIPE SALOMÃO
RECORRENTE : BALUMA S⁄A
ADVOGADO : JULIANA LÚCIA FINELLI E OUTRO(S)
RECORRIDO : ADALBERTO ALVES SANTANA
ADVOGADO : ADRIANA NADUR MOTTA CLEMENTE

 

EMENTA

 

DIREITO COMERCIAL. RECURSO ESPECIAL. CHEQUES. BENEFICIÁRIA DOMICILIADA NO EXTERIOR. PRAÇA DE EMISSÃO. OBSERVÂNCIA AO QUE CONSTA NA CÁRTULA. AÇÃO DE LOCUPLETAMENTO SEM CAUSA DE NATUREZA CAMBIAL.  TRANSCURSO DO PRAZO PREVISTO NO ARTIGO 61 DA LEI 7.357⁄85. POSSIBILIDADE DE AJUIZAMENTO DE AÇÃO DE COBRANÇA, COM DESCRIÇÃO DO NEGÓCIO JURÍDICO SUBJACENTE, OU DE AÇÃO MONITÓRIA, CUJO PRAZO PRESCRICIONAL É DE 5 ANOS.

 

1. O cheque é título de crédito que se submete aos princípios cambiários da cartularidade, literalidade, abstração, autonomia das obrigações cambiais e inoponibilidade das exceções pessoais a terceiros de boa-fé, por isso deve ser considerado como local de emissão o indicado no título.

2.  O artigo 33 da Lei 7.357⁄85 prevê expressamente que o cheque pode ser emitido no exterior, não podendo, portanto, servir de escusa a alegação de que o local consignado na cártula diverge daquele em que ela foi efetivamente emitida por a beneficiária não ter domicílio no Brasil.

3. O fato de a tomadora ter domicílio no estrangeiro não elide, por si só, a possibilidade de o cheque ter sido recebido na praça constante da cártula, ainda que por um representante ou preposto da tomadora.

4. O cheque é ordem de pagamento à vista, sendo de 6 (seis) meses o lapso prescricional para a execução após o prazo de apresentação, que é de 30 (trinta) dias a contar da emissão, se da mesma praça, ou de 60 (sessenta) dias, também a contar da emissão, se consta no título como sacado em praça diversa, isto é, em município distinto daquele em que se situa a agência pagadora.

5. Prescrito o prazo para execução do cheque, o artigo 61 da Lei do Cheque prevê, no prazo de 2 (dois) anos a contar da prescrição, a possibilidade de ajuizamento de ação de locupletamento ilícito que, por ostentar natureza cambial, prescinde da descrição do negócio jurídico subjacente. Expirado o prazo para ajuizamento da ação por enriquecimento sem causa, o artigo 62 do mesmo Diploma legal ressalva a possibilidade de ajuizamento ainda de ação fundada na relação causal, a exigir, portanto, menção ao negócio jurídico que ensejou a emissão do cheque.

6. A jurisprudência desta Corte admite também o ajuizamento de ação monitória (Súmula 299⁄STJ) com base em cheque prescrito, sem necessidade de descrição da causa debendi, reconhecendo que a cártula satisfaz a exigência da "prova escrita sem eficácia de título executivo", a que alude o artigo 1.102-A do CPC.

7. Recurso especial não provido.

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

VOTO

 

O SENHOR MINISTRO LUIS FELIPE SALOMÃO (Relator):

 

2. A questão controvertida é quanto à possibilidade de, admitindo que os cheques são de praça diversa da agência pagadora do sacado, pelo fato de a tomadora ser empresa estrangeira, reconhecer que houve o oportuno ajuizamento da ação - de natureza cambial - de locupletamento ilícito.

A sentença consigna:

[...] no caso a presente ação está prescrita para os cheques emitidos em 12⁄1998, isto porque foram todos emitidos na cidade de São Paulo e para pagamento também em São Paulo, o da agência sacada, haja vista a incidência do artigo 1º, V, da Lei 7347⁄85, de modo que o prazo de apresentação é de 30 dias e não de 60 dias (art. 33), prazo primeiro que somado aos 6 meses do prazo de prescrição da execução (art. 59) e mais os 2 anos da ação cambiária do art. 61 redunda em termos finais anteriores ao aforamento da ação em 03⁄08⁄2011, razão pelas quais acolho essa respectiva tese de defesa.
Remanesce apenas hígida a ação em relação ao cheque de número UF 043561, emitido em 06⁄01⁄99, no valor de R$21.000,00, cuja obrigação de pagamento é do réu. (fl. 524)
 

O acórdão recorrido, por seu turno, afirma:

Os cheques que embasam a ação de cobrança foram emitidos entre 06.12.1998 e 06.01.1999 (fls. 38⁄43), enquanto a demanda foi proposta aos 03.08.2001 (fls. 02), retroagindo os efeitos do despacho ordenatório da citação ao momento da propositura da demanda (CPC, 263), no caso concreto, materializada pela simples distribuição da inicial, pelo que é de ser desacolhido o recurso interposto pelo réu.
[...]
No que tange ao recurso interposto pela credora, verifica-se que ajuizou a autora ação fundada no enriquecimento sem causa (art. 61 da Lei do Cheque), hipótese em que não poderia haver transcorrido o período de dois anos após a prescrição da execução dos cheques.
Ocorre que os citados títulos foram emitidos na praça de São Paulo, para o pagamento na mesma localidade, de modo que o prazo de apresentação era de apenas 30 dias (Lei 7.357⁄85, art. 33), o que implica no reconhecimento da necessidade de invocar-se na petição inicial o negócio jurídico que teria ensejado a emissão dos títulos discriminados a fls. 428 (Lei do Cheque, art. 62).
[...]
a) o cheque enquanto não vencido o prazo prescricional, é título que assegura o exercício da ação de execução;
b) vencido o prazo prescricional, a execução não é mais admissível, mas o credor pode, dentro de dois anos, valer-se da ação de locupletamento ilícito, bastando-lhe a apresentação do documento;
c) esgotado esse prazo, continua sendo admissível ao credor fundar-se na relação negocial subjacente, que é de natureza pessoal e prescreve, em regra, no prazo de vinte anos.
Na primeira hipótese, cabe ao credor alegar o crédito fundado no título. Na segunda, pleiteia o reconhecimento do direito ao recebimento, presumindo-se o não recebimento do valor pela simples apresentação do título. Na terceira, alega o negócio causal, para, daí, fazer decorrer o pedido condenatório".
Nessa conformidade, embora não prescrita a ação causal, de fato não havia como prosseguir-se com a demanda em relação àqueles títulos, ficando nesse aspecto mantida a r. sentença, com a alteração de seus dispositivo, para reconhecer-se a carência (CPC, art. 267, inciso VI) em relação aos títulos de fls. 38⁄39 e 41⁄43.
Ante o exposto, nega-se provimento a ambos os recursos, com observação. (fls. 628-633)
 

3. O cheque é título de crédito que se submete aos princípios cambiários da cartularidade, literalidade, abstração, autonomia das obrigações cambiais e inoponibilidade das exceções pessoais a terceiros de boa-fé:

DIREITO COMERCIAL. RECURSO ESPECIAL. CHEQUE.  ORDEM DE PAGAMENTO À VISTA. CARACTERE ESSENCIAL DO TÍTULO. DATA DE EMISSÃO DIVERSA DA PACTUADA PARA APRESENTAÇÃO DA CÁRTULA. COSTUME CONTRA LEGEM. INADMISSÃO PELO DIREITO BRASILEIRO. CONSIDERA-SE A DATA DE EMISSÃO CONSTANTE NO CHEQUE.
1. O cheque é ordem de pagamento à vista e submete-se aos princípios cambiários da cartularidade, literalidade, abstração, autonomia das obrigações cambiais e inoponibilidade das exceções pessoais a terceiros de boa-fé, por isso que a sua pós-datação não amplia o prazo de apresentação da cártula, cujo marco inicial é, efetivamente, a data da emissão.
[...]
4. Recurso especial não provido.
(REsp 875161⁄SC, Rel. Ministro LUIS FELIPE SALOMÃO, QUARTA TURMA, julgado em 09⁄08⁄2011, DJe 22⁄08⁄2011)
 
 
CIVIL E PROCESSUAL. AGRAVO REGIMENTAL. INEXISTÊNCIA DE DÉBITO E SUSTAÇÃO DE PROTESTO. AÇÃO DECLARATÓRIA. IMPOSSIBILIDADE. INGRESSO DAS MERCADORIAS NA EMPRESA. LAUDO PERICIAL. PAGAMENTO. AUSÊNCIA DE PROVA. LITERALIDADE DO TÍTULO - CHEQUE. REEXAME DO CONJUNTO FÁTICO-PROBATÓRIO. SÚMULA N. 7 DO STJ. PREQUESTIONAMENTO. AUSÊNCIA.
SÚMULAS N. 282 E 356 DO STF. (AgRg no Ag 808.673⁄RS, Rel. Ministro ALDIR PASSARINHO JUNIOR, QUARTA TURMA, julgado em 27⁄02⁄2007, DJ 16⁄04⁄2007, p. 210)
 
 

De outra parte, o artigo 33 da Lei 7.357⁄85 ("Lei do Cheque") dispõe:

Art . 33 O cheque deve ser apresentado para pagamento, a contar do dia da emissão, no prazo de 30 (trinta) dias, quando emitido no lugar onde houver de ser pago; e de 60 (sessenta) dias, quando emitido em outro lugar do País ou no exterior.
Parágrafo único - Quando o cheque é emitido entre lugares com calendários diferentes, considera-se como de emissão o dia correspondente do calendário do lugar de pagamento.
 

De fato, por expressa previsão legal, é admitida a emissão de cheque no exterior. Nessa hipótese, o prazo de apresentação para pagamento é de 60 dias:

FALÊNCIA. CHEQUE. PEDIDO FORMULADO POR CREDOR CIVIL. CITAÇÃO. PROTESTO ESPECIAL. PRESCRIÇÃO.
[...]
4. O lapso prescricional previsto no art. 59 da Lei nº 7.357, de 2.9.1985, somente tem início a partir da expiração do prazo para apresentação do cheque, que é de trinta dias, quando emitido no lugar onde deve ser pago, e de 60 dias, quando emitido em outro lugar do País ou no exterior (art. 33 da mesma Lei).
Recurso especial não conhecido.
(REsp 237.419⁄PR, Rel. Ministro BARROS MONTEIRO, QUARTA TURMA, julgado em 20⁄04⁄2004, DJ 01⁄07⁄2004, p. 199)

 

Destarte, não há como ser acolhida a tese recursal, pois a Lei do Cheque permite a sua emissão no exterior, não podendo, portanto, servir de escusa a alegação de que o local consignado na cártula diverge daquele em que ela foi efetivamente emitida por a beneficiária não ter domicílio no Brasil.

Ora, o fato de a tomadora ter domicílio no estrangeiro, não elide, por si só, a possibilidade de o cheque ter sido recebido na praça de emissão constante na cártula, ainda que por um representante ou preposto seu.

Outrossim, o acolhimento da tese recursal representaria inequívoca afronta ao princípio da literalidade, pois destoa do que informa o título:

Trata-se de um critério formal. Não interessa a rigor, o local efetivo da emissão, mas aquele que como tal consta do título. A comparação deste local com o do pagamento é que possibilita a definição do prazo de apresentação.
O credor que não observar o prazo da lei para apresentar o cheque ao sacado está sujeito às seguintes conseqüências: a) perda do direito de executar os coobrigados do cheque, ou seja, os endossantes e avalistas de endossantes, em qualquer hipóteses; b) perda do mesmo direito contra o emitente do cheque, se havia fundos durante o prazo de apresentação e eles deixaram de existir, em seguida ao término desse prazo, pro culpa não-imputável ao correntista (como, por exemplo, a falência do banco, o confisco governamental etc.). É o que prevê o art. 47, II, e seu § 3º da LC.
Um cheque não-apresentado durante o prazo legal pode ser pago pelo sacado, desde que não se encontre prescrito e, evidentemente, haja suficiente provisão de fundos em seu poder (art. 35, parágrafo único). A inobservância do prazo de apresentação, portanto, não desconstitui o título de crédito como ordem de pagamento à vista, mas importa nas graves sanções acima mencionadas. (COELHO, Fábio Ulhoa. Manual de Direito Comercial. 17 ed. São Paulo: Saraiva, p. 279)

 

4. O cheque é ordem de pagamento à vista, sendo de 6 (seis) meses o lapso prescricional para a execução após o prazo de apresentação, que é de 30 (trinta) dias a contar da emissão, se da mesma praça, ou de 60 (sessenta) dias, também a contar da emissão, se consta no título como sacado em praça diversa, isto é, em município distinto daquele em que se situa a agência pagadora.

Prescrito o prazo para execução do cheque, o artigo 61 da Lei do Cheque prevê, no prazo de 2 anos a contar da prescrição, a possibilidade de ajuizamento ação de locupletamento ilícito que, por ostentar natureza cambial, prescinde da descrição do negócio jurídico subjacente.

Expirado o prazo para ajuizamento da ação por enriquecimento sem causa, o artigo 62 do mesmo Diploma legal ressalva a possibilidade ainda de ajuizamento de ação fundada na relação causal, a exigir, portanto, menção ao negócio jurídico que ensejou a emissão do cheque.

Confira-se o disposto nos mencionados artigos:

Art . 61 A ação de enriquecimento contra o emitente ou outros obrigados, que se locupletaram injustamente com o não-pagamento do cheque, prescreve em 2 (dois) anos, contados do dia em que se consumar a prescrição prevista no art. 59 e seu parágrafo desta Lei.
 
Art . 62 Salvo prova de novação, a emissão ou a transferência do cheque não exclui a ação fundada na relação causal, feita a prova do não-pagamento.
 

5. Todavia, o cheque, salvo pactuação em contrário, só extingue a dívida, isto é, a obrigação que ele visa satisfazer, com o seu efetivo pagamento:

O cheque, como reiteradamente dissemos, é uma ordem de pagamento à vista. Sua função principal, portanto, é efetuar a extinção de uma obrigação, desde que efetuado o pagamento. Mas em sua essência é um título pro soluto e não pro solvendo. A dívida que ele visou pagar só se extingue se ele for efetivamente pago, a não ser que o portador tenha convencionado que ele extingue a obrigação fundamental. (REQUIÃO, Rubens. Curso de Direito Comercial. 27 ed.: Saraiva, São Paulo, v. 2,  p. 570)

 

Com efeito, é importante observar que o artigo 62 da Lei 7.357⁄85 ressalva que "salvo prova de novação, a emissão ou a transferência do cheque não exclui a ação fundada na relação causal, feita a prova do não-pagamento":

Leciona a doutrina:

Após o decurso do prazo prescricional do cheque, será admissível ação com base no locupletamento sem causa, no prazo de 2 anos (art. 61). Embora se cuide de ação de conhecimento, é ainda de fundamento cambial. Qualquer coobrigado cambial que se locupletou indevidamente em função da prescrição do cheque pode ser responsabilizado.
Prescrita a ação de enriquecimento ilícito, nenhuma outra ação será possível com base no título de crédito. Poderá, no entanto, o credor por obrigação que, embora representada por um cheque, seja de origem extracambiária promover a ação correspondente a seu título, que prescreverá no prazo que a lei específica estabelecer ou nos termos do art. 205 do CC. A própria Lei do Cheque possibilita esse entendimento ao dispor, no seu art. 62, que, salvo prova de novação, a emissão ou transferência do cheque não exclui a ação fundada na relação causal, feita a prova do não-pagamento. (COELHO, Fábio Ulhoa. Manual de Direito Comercial. 17 ed.: Saraiva, São Paulo, p. 283)
 
-----------------------------------------------------------------------------------------------------------------
 
2. Diferenciação entre ação de locupletamento e ação causal, com a conseqüente distinção dos requisitos de cada uma (respectivamente, arts. 61 e 62, da Lei 7.357⁄85)
[...]
Nota-se a existência de confusão entre essas duas pretensões, que têm prazos prescricionais também diferentes.
O que ambas têm em comum é que são ação condenatória, processo de conhecimento, e referem-se a cheques sem pagamento.
Interessante observar que Tullio Ascarelli já assinalava (Teoria geral, p. 62) que no direito ítalo-francês exige-se, embora com maior ou menor rigor, a indicação da causa na petição inicial. Mas esclarece que a indicação da causa tem simples relevância probatória, até prova em contrário (cautio indiscreta - art. 129, 3º, do Código Comercial). Como a ação de locupletamento é causal, resulta que não há obrigação residual válida do cheque, sem causa válida (p. 71, Ascarelli), o que exprime o chamado princípio da causalidade.
Já na execução, a abstração assegura a executoriedade de per si do título (e⁄ou vice-versa), como também anota Ascarelli, p. 49-50.
[...]
Como visto na anotação n. 2 feita ao art. 61, o teor do art. 62, ao remeter o credor do negócio subjacente ao cheque, na hipótese ali descrita, à "ação fundada na relação causal", refere-se a um quarto gênero de ação, agora extracambial, regulada pelo direito comum, que não se confunde com a execução (art. 47), nem com a ação regressiva, também cambial (parágrafo único do art. 59), e nem com a ação de locupletamento ilícito (art. 61), cambiariforme.
Esse direito de ação comum causal pode ser exercido através de mais de um procedimento, seja de cobrança (ordinária ou sumária), seja por ação monitória, desde que satisfeitos os requisitos pertinentes.
No capítulo que trata da prescrição, o quarto gênero de ação causal (art. 62) não teve o seu prazo prescricional regulado, porque é matéria estranha ao âmbito da lei do cheque, ou seja, porque é de direito comum ou de legislação especial outra, a que cabe disciplinar a correspondente prescrição.
[...]
Importante não perder de vista que na prática a utilização, pelo credor, desses procedimentos, decorre da perda da eficácia executiva do cheque. Isso é dito quanto à ação do art. 62, não porque esteja prevista essa circunstância, mas porque é muito improvável que quem disponha da força executiva do cheque a ela renuncie para intentar ação condenatória pela via de conhecimento, fundada exclusivamente na relação causal.
Do ponto de vista do devedor, do negócio jurídico que deu origem à emissão de cheque como meio de pagamento, evidentemente que não está excluída ação sua fundada na relação causal, seja com base no direito comum, seja como consumidor, valendo-se da proteção especial que lhe assegura o Código de Defesa do Consumidor. Portanto- isso é fundamental-, o art. 62 da Lei 7.357⁄85 não exclui o uso da ação causal, nem deveria fazê-lo, pelo obrigado chéquico.
As alternativas são de livre escolha da conveniência do credor, direito este que está na base da disposição expressa no art. 62; o qual, por sua vez,  tem como suposto a natureza jurídica do cheque como meio de pagamento, que, por isso, não tem força liberatória da moeda, enquanto não disponível o numerário. O cheque não libera da obrigação causal, pendente de pagamento, que não tenha sido extinta por novação.
Em resumo, não é porque houve emissão ou transmissão do cheque para solver uma obrigação, que a força executiva a ele inerente excluiria a ação fundada na relação jurídica subjacente, prevalecendo o brocardo de quem pode o mais, pode o menos. Esse foi cuidado que preocupou o legislador na redação detalhada do art. 62, para evitar equívocos de interpretação; e também, para não excluir do obrigado chéquico o direito de discutir o motivo da emissão, por ação fundada na relação causal.
2. cheque não tem força liberatória da obrigação causal
Além do que já se viu acima, reafirma-se que o art. 62 não regula a prescrição da ação causal; antes, estabelece o direito de exercício dessa ação, pelo credor, com a explicitação complementar de que a emissão do cheque ou sua transferência em razão de um negócio, não exclui o direito de agir com fundamento na relação jurídica causal; e sem excluir igual direito ao devedor, assegurado por outros diplomas legais. (RESTIFFE, Paulo Sérgio; RESTIFFE NETO, Paulo. Lei do Cheque. 4 ed.: Revista dos Tribunais, São Paulo, ps. 353-362)
 
 

5.1. Com efeito, expirado o prazo prescricional previsto no artigo 61 da Lei do Cheque, cabe ao portador do cheque o ajuizamento de ação de cobrança, tendo por base o negócio jurídico subjacente, servindo a cártula como início de prova daquele negócio que, por conseguinte, deverá ser mencionado.

5.2. A jurisprudência desta Corte admite também o ajuizamento de ação monitória (Súmula 299⁄STJ), reconhecendo que a cártula satisfaz a exigência da "prova escrita sem eficácia de título executivo" a que alude o artigo 1102-A, do Código de Processo Civil:

AGRAVO REGIMENTAL - AÇÃO MONITÓRIA - CHEQUE PRESCRITO ATÉ PARA AÇÃO DE LOCUPLETAMENTO - CAUSA DEBENDI - DESNECESSIDADE.
- O cheque prescrito serve como instrumento de ação monitória, mesmo vencido o prazo de dois anos para a ação de enriquecimento (Lei do Cheque, Art. 61), pois o Art. 1.102a, do CPC exige apenas "prova escrita sem eficácia de título executivo". Desnecessária a demonstração da causa debendi.
(AgRg no REsp 873.879⁄SC, Rel. Ministro HUMBERTO GOMES DE BARROS, TERCEIRA TURMA, julgado em 03⁄12⁄2007, DJ 12⁄12⁄2007, p. 418)
 

Caso o portador do cheque opte pela ação monitória, o prazo prescricional será quinquenal, conforme disposto no artigo 206, § 5º, I, do Código Civil e não haverá necessidade de descrição da causa debendi:

DIREITO PROCESSUAL CIVIL E COMERCIAL. AGRAVO REGIMENTAL. OMISSÃO. INEXISTÊNCIA. REEXAME DE PROVAS EM SEDE DE RECURSO ESPECIAL. INVIABILIDADE. AÇÃO MONITÓRIA COM LASTRO EM CHEQUE. PRAZO PRESCRICIONAL QUINQUENAL. CHEQUE. ATUALIZAÇÃO MONETÁRIA. TERMO INICIAL. DATA DE EMISSÃO.
1. Não caracteriza omissão, contradição ou obscuridade quando o tribunal adota outro fundamento que não aquele defendido pela parte.
2. Orienta a Súmula 07 desta Corte que a pretensão de simples reexame de provas não enseja recurso especial.
3. "A ação monitória fundada em cheque prescrito está subordinada ao prazo prescricional de 5 (cinco) anos de que trata o artigo 206, § 5º, I, do Código Civil". (AgRg no REsp 1011556⁄MT, Rel. Ministro JOÃO OTÁVIO DE NORONHA, QUARTA TURMA, julgado em 18⁄05⁄2010, DJe 27⁄05⁄2010)
4. A data de emissão do cheque é o termo inicial de incidência de atualização monetária.
5. Agravo regimental não provido.
(AgRg no REsp 1197643⁄SP, Rel. Ministro LUIS FELIPE SALOMÃO, QUARTA TURMA, julgado em 28⁄06⁄2011, DJe 01⁄07⁄2011)
 
 
CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. CHEQUE PRESCRITO. AÇÃO MONITÓRIA. PRAZO PRESCRICIONAL.
A ação monitória fundada em cheque prescrito está subordinada ao prazo prescricional de 5 (cinco) anos previsto no artigo 206, § 5º, I, do Código Civil.
Recurso Especial improvido.
(REsp 1038104⁄SP, Rel. Ministro SIDNEI BENETI, TERCEIRA TURMA, julgado em 09⁄06⁄2009, DJe 18⁄06⁄2009)
 
 
AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO DE INSTRUMENTO. AÇÃO MONITÓRIA FUNDADA EM CHEQUE PRESCRITO. PRAZO PRESCRICIONAL. DESCRIÇÃO DA CAUSA DEBENDI. DESNECESSIDADE. AGRAVO REGIMENTAL A QUE SE NEGA PROVIMENTO.
1. A ação monitória fundada em cheque prescrito está subordinada ao prazo prescricional de 5 (cinco) anos previsto no artigo 206, § 5º, I, do Código Civil.
2. O Acórdão recorrido está em consonância com a jurisprudência desta Corte, no sentido de que é desnecessário que o credor comprove a causa debendi do cheque prescrito que instrui a ação monitória.
3. Agravo regimental a que se nega provimento.
(AgRg no Ag 1401202⁄DF, Rel. Ministro LUIS FELIPE SALOMÃO, QUARTA TURMA, julgado em 09⁄08⁄2011, DJe 16⁄08⁄2011)
 
 
PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO DE INSTRUMENTO. AÇÃO MONITÓRIA. CHEQUE PRESCRITO. DESCRIÇÃO DA CAUSA DEBENDI. DESNECESSIDADE. PRECEDENTES.
1. Em ação monitória para cobrança de cheque prescrito, desnecessário que o credor comprove a "causa debendi" que originou o documento.
2. Agravo regimental provido.
(AgRg no Ag 965.195⁄SP, Rel. Ministro JOÃO OTÁVIO DE NORONHA, QUARTA TURMA, julgado em 10⁄06⁄2008, DJe 23⁄06⁄2008)
 
AGRAVO REGIMENTAL - AGRAVO DE INSTRUMENTO - AÇÃO MONITÓRIA - CHEQUES PRESCRITOS - PRODUÇÃO DE PROVA - CERCEAMENTO DE DEFESA - REEXAME DO CONJUNTO FÁTICO-PROBATÓRIO - IMPOSSIBILIDADE - SÚMULA 7⁄STJ - CAUSA DEBENDI - PROVA - DESNECESSIDADE - DECISÃO AGRAVADA MANTIDA - IMPROVIMENTO.
I - Sendo o magistrado o destinatário da prova, e a ele cabe decidir sobre o necessário à formação do próprio convencimento. Desse modo, a apuração da suficiência dos elementos probatórios que justificaram o indeferimento do pedido de produção de provas demanda reexame do conjunto fático-probatório, providência vedada pela Súmula 7⁄STJ.
II - O Acórdão recorrido está em consonância com a jurisprudência desta Corte, no sentido de que é desnecessário que o credor comprove a causa debendi do cheque prescrito que instrui a ação monitória.
III - O Agravo não trouxe nenhum argumento novo capaz de modificar a conclusão alvitrada, a qual se mantém por seus próprios fundamentos.
Agravo Regimental improvido.
(AgRg no Ag 1376537⁄SC, Rel. Ministro SIDNEI BENETI, TERCEIRA TURMA, julgado em 17⁄03⁄2011, DJe 30⁄03⁄2011)
 

 

6. Os cheques que embasam a ação foram emitidos em 6.12.1998 e 6.1.1999, na mesma praça de pagamento, de modo que o prazo de apresentação era de apenas 30 dias, após o qual fluiu o prazo para execução de 6 meses,  o que acarreta o reconhecimento de que a  presente ação de natureza cambial de locupletamento ilícito, proposta em 3 de agosto de 2001, foi ajuizada há mais de 2 anos após a prescrição dos cheques emitidos em dezembro de 1998, após, portanto, o prazo previsto no artigo 61 da Lei do Cheque.

Com efeito, não merece acolhida a irresignação, pois, como bem observado pela Corte de origem, tendo a ação sido ajuizada mais de 2 anos após a prescrição do cheques emitidos em 6.12.1998, já não era cabível a utilização da ação prevista no artigo 61 da Lei do Cheque, sendo imprescindível a menção ao negócio jurídico subjacente, conforme previsto no artigo 62 da Lei do Cheque. 

7. Diante do exposto, nego provimento ao recurso especial.

É como voto.

 
 
 
CERTIDÃO DE JULGAMENTO
QUARTA TURMA
Número Registro: 2010⁄0067085-0
PROCESSO ELETRÔNICO
REsp 1.190.037 ⁄ SP
 
 
Números Origem:  200701527877          70042767              7004276701
 
PAUTA: 06⁄09⁄2011 JULGADO: 06⁄09⁄2011
   
Relator
Exmo. Sr. Ministro  LUIS FELIPE SALOMÃO
 
Presidente da Sessão
Exmo. Sr. Ministro LUIS FELIPE SALOMÃO
 
Subprocurador-Geral da República
Exmo. Sr. Dr. ANTÔNIO CARLOS PESSOA LINS
 
Secretária
Bela. TERESA HELENA DA ROCHA BASEVI
 
AUTUAÇÃO
 
RECORRENTE : BALUMA S⁄A
ADVOGADO : JULIANA LÚCIA FINELLI E OUTRO(S)
RECORRIDO : ADALBERTO ALVES SANTANA
ADVOGADO : ADRIANA NADUR MOTTA CLEMENTE
 
ASSUNTO: DIREITO CIVIL - Obrigações - Espécies de Títulos de Crédito - Cheque
 
CERTIDÃO
 
Certifico que a egrégia QUARTA TURMA, ao apreciar o processo em epígrafe na sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:
 
A Turma, por unanimidade, negou provimento ao recurso especial, nos termos do voto do Sr. Ministro Relator.
Os Srs. Ministros Raul Araújo, Maria Isabel Gallotti, Antonio Carlos Ferreira e Marco Buzzi votaram com o Sr. Ministro Relator.
 

Documento: 1086322 Inteiro Teor do Acórdão - DJe: 27/09/2011

sábado, 24 de setembro de 2011

Vedação à fazenda como devedora cambiária (exceto empresa estatal)

LRF


http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/LCP/Lcp101.htm


        Art. 37. Equiparam-se a operações de crédito e estão vedados:

        I - captação de recursos a título de antecipação de receita de tributo ou contribuição cujo fato gerador ainda não tenha ocorrido, sem prejuízo do disposto no§ 7o do art. 150 da Constituição;

        II - recebimento antecipado de valores de empresa em que o Poder Público detenha, direta ou indiretamente, a maioria do capital social com direito a voto, salvo lucros e dividendos, na forma da legislação;

        III - assunção direta de compromisso, confissão de dívida ou operação assemelhada, com fornecedor de bens, mercadorias ou serviços, mediante emissão, aceite ou aval de título de crédito, não se aplicando esta vedação a empresas estatais dependentes;

        IV - assunção de obrigação, sem autorização orçamentária, com fornecedores para pagamento a posteriori de bens e serviços.


quarta-feira, 21 de setembro de 2011

CHEQUE. BENEFICIÁRIA. DOMICÍLIO. EXTERIOR. COBRANÇA.

CHEQUE. BENEFICIÁRIA. DOMICÍLIO. EXTERIOR. COBRANÇA.

Cinge-se a questão à possibilidade de, admitindo-se que os cheques sejam de praça diversa da agência pagadora do sacado pelo fato de a tomadora ser empresa estrangeira, reconhecer-se que houve o oportuno ajuizamento da ação de locupletamento ilícito, de natureza cambial. No caso, cuidou-se, na origem, de ação de cobrança de cheques no total de R$ 126 mil, não depositados diante da afirmação do emitente de inexistirem fundos em sua conta. No REsp, a recorrente sustenta, entre outros temas, violação dos arts. 33, 59 e 61 da Lei n. 7.357/1985, alegando que os cheques continuam sendo títulos de crédito, pois foram emitidos em praça diversa, tendo em vista tratar-se de empresa estrangeira. Inicialmente, destacou o Min. Relator que, sendo o cheque título de crédito, submete-se aos princípios cambiários da cartularidade, literalidade, abstração, autonomia das obrigações cambiais e inoponibilidade das exceções pessoais a terceiros de boa-fé, por isso deve ser considerado como local de emissão o indicado no título. Ademais, o art. 33 da referida lei prevê que o cheque possa ser emitido no exterior; não pode, portanto, servir de justificativa a alegação de que o local consignado na cártula diverge daquele em que ela foi efetivamente emitida, pelo fato de a beneficiária não ter domicílio no Brasil. Até porque, o fato de a tomadora ter domicílio no estrangeiro não elide, por si só, a possibilidade de o cheque ter sido recebido na praça constante da cártula, ainda que por um representante ou preposto da tomadora. Ressaltou, ainda, que o cheque é ordem de pagamento à vista, sendo de seis meses o lapso prescricional para a execução do cheque após o prazo de apresentação, que é de 30 dias a contar da emissão se da mesma praça ou de 60 dias, também a contar da emissão, se consta no título como sacado em praça diversa, isto é, município distinto daquele em que se situa a agência pagadora. Registrou, ademais, que, uma vez prescrito o prazo para a execução do cheque, o art. 61 da Lei n. 7.357/1985 prevê, no prazo de dois anos a contar da prescrição, a possibilidade de ajuizamento de ação de locupletamento ilícito, que, por ostentar natureza cambial, prescinde da descrição do negócio jurídico subjacente. No entanto, expirado o prazo para ajuizamento da ação por enriquecimento sem causa, o art. 62 da mesma lei ressalva a possibilidade de ajuizamento de ação fundada na relação causal, a exigir, portanto, menção ao negócio jurídico que ensejou a emissão do cheque. In casu, os cheques que embasaram a ação foram emitidos em 6/12/1998 e 6/1/1999, na mesma praça de pagamento, de modo que o prazo de apresentação era de apenas 30 dias, após o qual fluiu o prazo para execução de seis meses, no entanto a ação de natureza cambial de locupletamento ilícito foi proposta em 3/8/2001, ou seja, mais de dois anos após a prescrição dos cheques emitidos em dezembro de 1998; após, portanto, o prazo legal previsto (art. 61 da Lei n. 7.357/1985). Assim, concluiu que não era cabível a utilização da mencionada ação, sendo imprescindível a menção ao negócio jurídico subjacente, conforme previsto no art. 62 da aludida lei. Com essas, entre outras considerações, a Turma negou provimento ao recurso. Precedentes citados: REsp 875.161-SC, DJe 22/8/2011, e REsp 237.419-PR, DJ 1º/7/2004. REsp 1.190.037-SP, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, julgado em 6/9/2011.

quinta-feira, 15 de setembro de 2011

Credor de dívida com banco não é obrigado a aceitar títulos do Tesouro Nacional

15/09/2011 - 12h02
DECISÃO
Credor de dívida com banco não é obrigado a aceitar títulos do Tesouro Nacional
A Quarta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) reconheceu que o credor de dívida com banco não é obrigado a aceitar o pagamento em títulos da dívida pública, de menor liquidez, em detrimento de dinheiro. A decisão considerou legítima a recusa de credor aos títulos do Tesouro Nacional oferecidos à penhora pelo Banco Santander, como garantia de uma dívida de R$ 180 mil.

O credor da dívida impugnou a nomeação à penhora de títulos do Tesouro Nacional tentada pelo Santander, requerendo que a penhora fosse sobre dinheiro. Tanto o juízo de primeiro grau quanto o Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul (TJRS) indeferiram a nomeação, entendendo que os títulos têm liquidez baixa e que, de qualquer forma, o banco dispõe de numerário capaz de garantir a execução da dívida.

Inconformado, o Banco Santander recorreu ao STJ, alegando que as decisões contrariam o princípio da menor onerosidade ao devedor. Entretanto, o ministro Luis Felipe Salomão destacou que a nomeação à penhora de outros bens que não o dinheiro só é válida quando o credor concordar, já que a gradação de bens (estabelecida no artigo 655 do Código de Processo Civil) existe apenas para beneficiar o credor, não o devedor.

Além disso, o ministro lembrou que é ponto pacífico (Súmula 328/STJ) que, na execução contra instituição financeira, a penhora seja em dinheiro, respeitadas as reservas legais exigidas pelo Banco Central. Segundo salientou o relator, também é entendimento pacificado que a recusa à penhora de títulos públicos é legítima, visto que eles têm baixa liquidez, e a execução só é efetiva quando capaz de conceder ao credor a quantia em dinheiro a que tem direito.

O ministro concluiu observando que o Banco Santander, conforme o entendimento manifestado pelas instâncias ordinárias, dispõe de recursos suficientes para pagar a dívida, e que a penhora de títulos do Tesouro Nacional só representaria "dispêndio de tempo e atos processuais para o Judiciário, afrontando os princípios da efetividade, economia e celeridade processual".

segunda-feira, 12 de setembro de 2011

UNIFORM COMMERCIAL CODE - ARTICLE 3 - NEGOTIABLE INSTRUMENTS

http://www.law.cornell.edu/ucc/3/overview.html

UNIFORM COMMERCIAL CODE - ARTICLE 3
NEGOTIABLE INSTRUMENTS

Copyright 1978, 1987, 1988, 1990, 1991, 1992 by The American Law Institute and the National Conference of Commissioners on Uniform State Laws; reproduced, published and distributed with the permission of the Permanent Editorial Board for the Uniform Commercial Code for the limited purposes of study, teaching, and academic research.
[For Article 3 as enacted by a particular state and any proposed revisions click here.]

[Full Text Search]


ADDENDUM TO REVISED ARTICLE 3

PART 1. GENERAL PROVISIONS AND DEFINITIONS

PART 2. NEGOTIATION, TRANSFER, AND INDORSEMENT

PART 3. ENFORCEMENT OF INSTRUMENTS

PART 4. LIABILITY OF PARTIES

PART 5. DISHONOR

PART 6. DISCHARGE AND PAYMENT


PART 1. GENERAL PROVISIONS AND DEFINITIONS

PART 2. NEGOTIATION, TRANSFER, AND INDORSEMENT

PART 3. ENFORCEMENT OF INSTRUMENTS

PART 4. LIABILITY OF PARTIES

PART 5. DISHONOR

PART 6. DISCHARGE AND PAYMENT

sexta-feira, 9 de setembro de 2011

Mantida liminar que suspendeu tarifa por estouro de cheque especial

09/09/2011 - 09h03
DECISÃO
Mantida liminar que suspendeu tarifa por estouro de cheque especial
O ministro Luis Felipe Salomão, do Superior Tribunal de Justiça (STJ), rejeitou agravo interposto pelo Banco do Brasil na tentativa de derrubar liminar da justiça do Rio de Janeiro que suspendeu a cobrança da "tarifa de adiantamento a depositante", aplicada contra quem excede os limites do cheque especial. O objetivo do agravo era que o STJ analisasse recurso especial apresentado pelo banco contra a liminar.

O adiantamento a depositantes é a "permissão" dada ao cliente para que estoure sua conta corrente, ou exceda seu limite de cheque especial, caso o tenha. O Ministério Público propôs ação civil pública contra o Banco do Brasil para impedir a cobrança de tarifa por esse adiantamento, da maneira como vinha sendo feita pela instituição (incidência de mais de uma vez na conta-corrente).

O juiz concedeu liminar e suspendeu provisoriamente a cobrança, até o julgamento da ação. O banco tentou cassar a liminar, mas o Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro (TJRJ) considerou que as alegações do Ministério Público eram verossímeis, "diante da possível abusividade da cobrança", nos termos do artigo 39 do Código de Defesa do Consumidor (CDC).

Ao manter a liminar, o TJRJ observou que a "tarifa de adiantamento a depositante" tem como fato gerador o excesso cometido pelo cliente em relação ao limite do cheque especial, mas "incide mais de uma vez sobre o mesmo correntista, em relação à mesma conta corrente". O artigo 39 do CDC proíbe "vantagem manifestamente excessiva" nas relações das empresas com seus clientes.

Quanto ao receio de dano irreparável ou de difícil reparação – um dos pressupostos da medida liminar –, o TJRJ considerou que as questões referentes à defesa do consumidor exigem atuação eficiente do Poder Judiciário, "pois a autorização da cobrança da tarifa imporá dano de difícil reparação na repetição do indébito, que alcançará indistintamente toda uma coletividade".

O Banco do Brasil entrou com recurso especial para tentar reverter a decisão do TJRJ no STJ, mas o recurso não passou pelo exame prévio de admissibilidade no tribunal fluminense. Contra isso, interpôs o agravo, sustentando que não estariam presentes os requisitos necessários para a concessão da liminar.

Em sua decisão, o ministro Salomão observou que o TJRJ, ao confirmar a liminar, amparou-se na jurisprudência do STJ, na análise das provas do processo e das cláusulas contratuais, verificando indícios de razão nas alegações do Ministério Público.

"Verificar se estão presentes, ou não, os requisitos da verossimilhança, bem como danos irreparáveis ou de difícil reparação, quando o acórdão recorrido os reconheceu amparado na análise soberana dos elementos fático-probatórios dos autos, demanda o reexame das provas, procedimento vedado em sede de recurso especial a teor do enunciado 7 da súmula do STJ", afirmou o ministro.

Luis Felipe Salomão apontou que a jurisprudência não admite o uso de recurso especial para discutir os requisitos da concessão de liminares – seja pelo seu caráter provisório, seja pelo impedimento da Súmula 7.
 

quinta-feira, 8 de setembro de 2011

cheque predatado e prescrição

STJ

Data de emissão do cheque é o termo inicial para a fluência do prazo executório

 

A Quarta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) consolidou o entendimento de que o cheque deixa de ser título executivo no prazo de seis meses, contados do término do prazo de apresentação fixado pela Lei 7.357/85. A Quarta Turma considerou que o prazo de prescrição se encontra estritamente vinculado à data em que foi emitido e a regra persiste independentemente de o cheque ter sido emitido de forma pós-datada.

A Lei do Cheque confere ao portador o prazo de apresentação de 30 dias, se emitido na praça de pagamento, ou de 60 dias, se emitido em outro lugar do território nacional ou no exterior. Decorrida a prescrição, de seis meses após esses períodos, o cheque perde a executividade, ou seja, não serve mais para instruir processos de execução e somente pode ser cobrado por ação monitória ou ação de conhecimento – que é demorada, admite provas e discussões em torno da sua origem e legalidade.

No caso decidido pelo STJ, um comerciante de Santa Catarina recebeu cheques com data de emissão do dia 20 de novembro de 2000 e, por conta de acordo feito com o cliente, prometeu apresentá-los somente no dia 31 de agosto de 2001. O comerciante alegava que da última data é que deveria contar o prazo de apresentação. O cheque foi apresentado à compensação em 5 de outubro de 2001. O comerciante alegou que o acordo para apresentação do cheque deveria ser respeitado.

A Quarta Turma entende que, nas hipóteses em que a data de emissão difere daquela ajustada entre as partes, o prazo de apresentação tem início no dia constante como sendo a da emissão. Segundo o relator, ministro Luis Felipe Salomão, o cheque é ordem de pagamento à vista e se submete aos princípios cambiários. A ampliação do prazo de prescrição, segundo ele, é repelida pelo artigo 192 do Código Civil.

De acordo com o relator, a utilização de cheque pós-datado, embora disseminada socialmente, impõe ao tomador do título a possibilidade de assumir riscos, como o encurtamento do prazo prescricional, bem como a possibilidade de ser responsabilizado civilmente pela apresentação do cheque antes do prazo estipulado.

REsp 875161